A Síndrome do Mágico Simão

Em tempos de crise de personalidade e postura, fico pensando como os homens são vulneráveis e irresponsáveis em suas considerações, no afã de justificarem suas atitudes.

Fazendo uma reflexão, foi lá pelos anos 80, que se fixou na política brasileira, a idéia do "É dando que se recebe", quando o Deputado do então centrão, Roberto Cardoso Alves, citou "São" Francisco de Assis, dando um tom de credibilidade religiosa, o que justificaria as mazelas de corrupção, naquele tempo ainda praticadas às escondidas, mas que, doravante passaram a ficar cada vez mais nítidas, até chegar a ponto do que se vê hoje, praticamente tudo às claras e como já se sabe, com ferramentas legais e jurídicas para que resistam a qualquer investigação.
Todos sabem que o erro existe, mas não se tem como provar, e como a prova é o perfeito ônus do nosso argumento jurídico, nada dá em nada, e, como já virou frase de efeito, no Brasil tudo acaba em pizza.
Muito embora, desde então a referida frase tenha virado moda no mundo político, quero aqui desqualificá-la, uma vez que fora citada totalmente fora de contexto pelo referido deputado, pois quando Francisco de Assis a pronunciou, foi na famosa "ORAÇÃO PELA PAZ", a ele atribuída.
Nessa oração, em nenhum momento o autor fala em interesses pecuniários, de imagem ou representatividade, mas, no homem que se entrega voluntariamente, sem barganhas, cobranças ou constrangimentos para a promoção da Paz.
Para tanto, os meios elencados pelo autor não passam nem de longe por valores monetários ou materiais, nem relacionados ao ter, mas exclusivamente ao ser, senão, vejamos os 10 principais valores citados na referida oração: paz, amor, perdão, união, fé, esperança, alegria, luz, consolação e compreensão. Como resultado final ele cita ainda a "VIDA ETERNA".

Ora, se a frase "É dando que se recebe" de Francisco de Assis, está descontextualizada para a política brasileira, lendo a Bíblia Sagrada encontro um relato que contextualiza qualquer fato de corrupção e suborno, seja do ponto de vista político, material e principalmente no campo espiritual:
E estava ali um certo homem chamado Simão, que anteriormente exercera naquela cidade a arte mágica e tinha iludido a gente de Samaria, dizendo que era uma grande personagem; ao qual todos atendiam, desde o menor até ao maior, dizendo: Este é a grande virtude de Deus. E atendiam-no a ele, porque já desde muito tempo os havia iludido com artes mágicas. Mas, como cressem em Filipe, que lhes pregava acerca do Reino de Deus e do nome de Jesus Cristo, se batizavam, tanto homens como mulheres. E creu até o próprio Simão; e, sendo batizado, ficou, de contínuo, com Filipe e, vendo os sinais e as grandes maravilhas que se faziam, estava atônito. Os apóstolos, pois, que estavam em Jerusalém, ouvindo que Samaria recebera a palavra de Deus, enviaram para lá Pedro e João, os quais, tendo descido, oraram por eles para que recebessem o Espírito Santo. (Porque sobre nenhum deles tinha ainda descido, mas somente eram batizados em nome do Senhor Jesus.) Então, lhes impuseram as mãos, e receberam o Espírito Santo. E Simão, vendo que pela imposição das mãos dos apóstolos era dado o Espírito Santo, lhes ofereceu dinheiro, dizendo: Dê-me também a mim esse poder, para que aquele sobre quem eu puser as mãos receba o Espírito Santo.
Mas disse-lhe Pedro:
O teu dinheiro seja contigo para perdição, pois cuidaste que o dom de Deus se alcança por dinheiro. Tu não tens parte nem sorte nesta palavra, porque o teu coração não é reto diante de Deus. Arrepende-te, pois, dessa tua iniqüidade e ora a Deus, para que, porventura, te seja perdoado o pensamento do teu coração; pois vejo que estás em fel de amargura e em laço de iniqüidade. Respondendo, porém, Simão disse: Orai vós por mim ao Senhor, para que nada do que dissestes venha sobre mim. Atos 8:9-24. (os grifos são meus)
A isto é que chamo de A SÍNDROME DO MÁGICO SIMÃO, ou seja, a tentação de comprar com seu dinheiro qualquer coisa que interesse, se possível for até o dom de Deus.
A Bíblia diz que Simão ficou atônito, ou seja, fascinado pelo sobrenatural, pelo extraordinário, pelo espetacular.
É um dos males dos nossos dias.
Quem tem posses, acha que pode tudo, como: comprar cargos públicos, eclesiásticos, dons, status, imagem, voto e até mesmo a consciência do próximo.
A coisa está tão séria e generalizada, que não passa somente por quem tem muitas posses, mas alguns subornam e outros se corrompem até por pequenos valores, pequenos presentes e outras coisas mais como, por exemplo, simplesmente estar perto de quem tem status.

Chamo sua atenção para um fator significativo:

Para que se concretize um ato de corrupção, é necessário que alguém tente o suborno, no caso foi o que fez o mágico Simão, mas é necessário também que alguém aceite se corromper, o que em absoluto não o fizeram, nem Pedro, nem João, nem Felipe, muito pelo contrário, eles tinham, e muito, o que tem faltado em nossos dias:

DISCERNIMENTO ESPIRITUAL.

Pelo discernimento espiritual, detectaram na mesma hora que havia no coração de Simão, fel de amargura e laços de iniqüidade.

Vejamos a importância do dom do discernimento!

Como diz o texto sagrado, Simão havia crido, sido batizado nas águas, porém, não estava convertido e nem liberto de fato. Possivelmente o mágico Simão estivesse até convencido de que o Evangelho fosse um grande negócio, quem sabe até mais lucrativo do que as suas magias, tanto é que ele estava disposto a pagar em dinheiro pelo poder de Deus, e vejamos que nesse caso, o pagamento não era em cheque sujeito à devolução, nem cartão de débito ou crédito sujeito a taxas administrativas, mas em dinheiro vivo, ou seja, conforme o costume da época, moedas de ouro e prata.
Os apóstolos que estavam revestidos pelo poder de Deus tinham discernimento, postura e autoridade espiritual, portanto, resistiram à oferta e não somente refutaram a idéia da corrupção, como também, Pedro ainda proferiu palavras de condenação sobre a vida do mágico caso não se arrependesse.

Simão muito esperto que era, instantaneamente, sentindo temor, pediu oração aos apóstolos, para que a condenação proferida não se concretizasse.
Desculpem a franqueza, mas acredito que nos dias de hoje, faltariam mágicos Simão em quantidade suficiente, para atender a demanda dos pregadores da prosperidade, para os quais os fins justificam os meios, pois diriam na hora que Deus abriu uma grande porta, que pescaram um grande peixe, que o homem espontaneamente queria ofertar e ninguém poderia proibir, diriam ainda, o homem acabou de aceitar Jesus, temos que ter paciência para não magoá-lo, a libertação e a santificação é o Espírito Santo que vai fazendo com o passar dos dias, etc... Tudo isso na obsessão de se apropriarem do dinheiro do homem.

Não foi assim que os apóstolos agiram, mas discerniram que a Síndrome do mágico Simão era subproduto de outra Síndrome pior: a de Lúcifer, como diz o autor de um conhecido livro.
A síndrome do ter antes do ser é uma verdadeira miséria.
A pessoa por ela atingida vai apresentando os sintomas de inveja, ciúme e contenda e, se preciso for, paga qualquer preço para ter, fugindo assim da responsabilidade do ser.
Toda vez que a ansiedade de ter algo, seja material ou espiritual, ultrapassa os limites da ética e da coerência, há algo maligno por trás disso. Por mais que não pareça, o vírus da síndrome está ali encubado, aguardando apenas o momento propício para se manifestar.Lembre-se que Satanás, no afã de ter a adoração de Jesus no deserto, aproveitou-se de um momento de aparente fragilidade humana do Senhor, após quarenta dias e quarenta noites de jejum e oração, e ofertou-lhe até o que a ele não pertencia.
Há pessoas que pagam para ter o que normalmente não merecem, e outros até se endividam para tal, e há ainda aqueles que não querem nem saber o que vem, de onde vem, nem como vem, desde que alcancem os objetivos que almejam, vendem de tudo, os dons de Deus, o voto de quem quer que seja e até própria consciência.
Quando se deparam com a falta de resultados espirituais em suas vidas, passam a viver de aparência, tentando enganar os outros, defendendo ideologias que não teem, porque de há muito já as venderam.
O Espírito Santo também há muito deles já se retirou. Estão vivendo apenas no vácuo da unção que já se foi, se é que em algum dia já tiveram.
Como não sabem mais fazer outra coisa que lhes dê sustento, continuam pregando, mas o que falam não é mais revelação divina, apenas arrotam a satisfação do seu próprio ventre.
Que o Senhor tenha misericórdia da nossa vida e ministério, e que nos dê a graça de termos a humildade, postura e autoridade espiritual de Pedro, João e Felipe, de tal maneira que não sejamos tentados e engodados pela SÍNDROME DO MÁGICO SIMÃO.

Pastor Carlos Roberto Silva